Mr. Domingues

Sempre ouvi que escrevo demais, e-mails longos, cartas intermináveis para namoradas, nunca consegui usar Post-it, enfim, bem ou mal eu gosto de escrever. A intenção é que isso aqui sirva como uma "descarga mental" onde comento fatos, acontecimentos e pensamentos, na verdade, tudo que me der vontade. Sabe quando se vê um filme, lê um livro ou algo no jornal e ficamos com vontade de discutir com alguém sobre o assunto? É pra isso que esse espaço serve, assim eu incomodo menos quem está à minha volta e começo a incomodar anônimos internet afora que queiram ser incomodados. Mas é claro que não vou fugir muito dos meus hobbies, interesses pessoais e profissionais, como saúde, atividade física, esporte, tecnologia e música.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Eurovelo, que inveja.
Pode parecer que estou obcecado por meios de transporte, mas é que li a notícia hoje e não pude deixar de sentir um pouco (mais um pouco) de inveja da Europa - "Ciclovia vai atravessar 20 países ao longo da Cortina de Ferro". O projeto tem apoio da União Europeia, de algumas empresas de ciclismo, da ECF (European Cyclist’s Federation) e dos governos de cada país. A intenção é integrar a Europa com uma ciclovia gigante - a EuroVelo, que somará, quando pronta, 60 mil km de ciclovias. Atualmente 45 mil km já estão praticamente prontos.
A Eurovelo é composta por vias que não foram construídas especificamente para esta finalidade (estradas já existentes) e por vias projetadas para o cicloturismo. As vias que já existiam precisaram ser aprovadas pela ECF e várias são as exigências. Entre as principais: possuir infraestrutura (comércio com provimentos a cada 30 km, hospedagem a cada 50 km e transporte público a cada 150 km); nas vias que permitem circulação de automóveis, que seja inferior a 1000 automóveis/dia; a inclinação não pode ser superior a 6%; e deve permitir 2 bicicletas lado a lado. Todas essas exigências servem para que o trajeto não seja feito apenas por atletas, a intenção é que qualquer pessoa com vontade possa pegar uma bicicleta e viajar, mesmo sem ter o condicionamento de um ciclista competitivo.
Os caminhos levam do norte da Noruega à Sicília (sul da Itália), de Moscou a Irlanda, de Londres a Roma, enfim, cruza a Europa de várias maneiras (mapa). Em alguns locais como a Áustria, vários hoteis ficam à beira da ciclovia e fornecem aos turistas (além do serviço de hotel normal) reparos em bicicletas, venda de peças, etc. Este último trecho a ser construído (o Eurovelo 13) se chamará Iron Courtain Trail, em alusão à “cortina de ferro”. Terá 7 mil km e cruzará 20 países. Projetos semelhantes já existem na Alemanha. Um deles é a ciclovia ao longo de antigo Muro de Berlim, com uma extensão de 160 km.
Enquanto isso, no Brasil temos apenas 600 km de ciclovias. Pelo clima do Brasil (propício para a atividade ao ar livre) e por sermos relativamente pobres (o que é um dos motivos que leva muitos trabalhadores a usar a bicicleta como meio de transporte) o investimento nesse tipo de transporte deveria ser muito maior. Além disso, se trata de grande um investimento inicial, mas que requer pouca manutenção quando comparado às outras vias.
Muitas das ciclovias brasileiras vão de nenhum lugar a lugar algum, ou seja, ficam num centro urbano e para usar a ciclovia a pessoa deve levar sua bicicleta até o local, de carro ou se arriscar no trânsito. Chegando lá o que se pode fazer é um vai-e-vem inútil de meia dúzia de quilômetros, ao longo de uma avenida, em volta de uma lagoa ou de uma praça, quase sempre desviando de pedestres, patinadores, skatistas, carrinhos de bebê, etc. Faltam ciclovias que acompanhem as vias normais, que percorram os trajetos que interligam bairro-centro ou cidades vizinhas.
A ciclovia aqui ainda é vista como um local para o lazer, para o pai ensinar o filho a pedalar ou para se passear nas manhãs de domingo. Falta entenderem que aquilo pode ser um local de lazer, mas a intenção principal da ciclovia é tornar-se uma alternativa ao trânsito motorizado, é para usar a bicicleta como meio de transporte barato, saudável e não poluente.
Minha irmã morou na Holanda na década de 90 e testemunhou que nos mercados, o espaço destinado às bicicletas era sempre maior do que o destinado a estacionar automóveis. Aqui qualquer estacionamento visa abrigar o maior número de automóveis, algum espaço para motocicletas, e se sobrar uns 5-6 metros se coloca um suporte metálico para encaixar a bicicleta.
Mas a mudança é muito mais profunda do que parece. Além do cicloturismo, dos mochileiros que querem viajar, faltam itens estruturais mais simples no país e visão empresarial, por exemplo, locais para guardar as bicicletas e chuveiros que permitam um banho ao chegar ao serviço após a pedalada. É uma questão de mudar de mentalidade. No Brasil, usar a bicicleta como meio de transporte é “coisa de pobre”, mas é um pensamento bastante atrasado. Lembro-me de ver os professores da tradicional University of Oxford pedalando de terno e gravata borboleta, indo para a universidade e entrando nas suas salas com um capacete embaixo do braço. O brasileiro é muito chique, alguém consegue imaginar um médico chegando ao hospital de bicicleta? O que iriam dizer - o doutor está maluco, ou é muito pão duro, tem dinheiro pra andar de carro, mas anda de bicicleta. Era capaz até de perder paciente já que o normal é o doutor chegar num carro importado porque isso parece ser sinônimo de competência e sucesso profissional. Infelizmente aqui bicicleta é para pedreiros e demais trabalhadores braçais.

3 comentários:

  1. Tenho esperança que, um dia, tenhamos a mesma iniciativa dos europeus! Há cerca de 4 décadas, eles também sofriam com os problemas do trânsito, mas se deram conta da praticidade e da "poesia" de incentivar seus cidadãos a usarem a bicicleta.
    Parabéns pelo blog e um grande abraço

    Gian

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  2. Muito bacana esse artigo, eu estava justamente procurando uma página em Português com esse assunto!

    Emmanuel M. Favre-Nicolin
    Blog Vitória Sustentável
    http://vitoria-sustentavel.blogspot.com

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  3. Para podermos desfrutar de uma pedalada digna eu e uns amigos iremos em Julho/16 fazer a EUROVELO 3,5,6 e 12, claro, apenas trechos que interligam os países dos quais queremos passar, faremos Amsterdã à Paris e Paris à bern na Suíça. Um amigo meu acabou de terminar a rota dele. Roma a Paris também passando pela Suíça, de acordo com ele fantástico, não vejo a hora de começar minha pedalada na EUROVELO.

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